«Ontem estive numa manifestação com uns largos milhares de pessoas, mulheres, homens, novas e velhos, velhas e novos, jovens e menos jovens, destas e daqueles, descemos todos juntos dos Restauradores ao Cais das Colunas a festejar o Dia Internacional da Mulher, por um mundo de liberdade, igualdade e fraternidade, contra as discriminações todas, pelos direitos todos, pelos deveres todos, contra a violência doméstica e as outras violências todas, incluindo as dos patrões que voltaram a despedir a Cristina Tavares, pela Paz, pelo Pão pelo Trabalho. Durante o trajecto, quando passávamos no Terreiro do Paço, olhei para a esquerda e vi um molhinho com umas cem, talvez duzentas pessoas, reunidas contra a violência doméstica. Achei bem, fiquei contente, achei bem que se manifestassem apenas contra uma parte do problema já que (ainda?) não conseguiam ver todas as outras faces do mesmo problema, e segui em frente, continuei com os milhares de homens e mulheres que desceram dos Restauradores ao Cais das Colunas a lutar por tudo e por todas. Há minutos vi a abertura de um telejornal de um canal da família balsemão. Vi a cobertura da reunião das 100 pessoas e não vi nada, rigorosamente nada, nem uma imagem, nem uma palavra, nada, sobre a manifestação de uns largos milhares de Mulheres e Homens que desceram dos Restauradores ao Cais da Colunas. A negra censura voltou a abater-se sobre o Portugal que já viu Abril. Agora sem lápis azul, agora feita pelos jornaleiros que se atascam nas produtoras de conteúdos dos balsemões deste mundo.»
E depois reúnem-se nuns restaurantes e nuns palácios para discutirem, com semblante de grande preocupação, a propagação de #fakeNews que eles próprios produzem?
Quem é que esses vermes querem enganar?
Poderia dar outros exemplos de um silenciamento que tem anos, mas seria chover no molhado, entretanto fica aqui a opinião de Fernanda Mateus, da Comissão Politica do PCP, sobre o silenciamento selectivo que se abateu sobre a manifestação do MDM, só para futura @Refer&ncia.
Registos sobre a luta pelos direitos das mulheres
(Fernada Mateus, Avante!, 2019/03/14)
Muitos milhares de mulheres compreenderam e responderam positivamente ao convite do MDM para comemorar o Dia Internacional da Mulher na Manifestação Nacional de Mulheres realizada no passado sábado, 9 de Março.
Tal adesão à forma de luta decidida pelo MDM para assinalar o Dia Internacional da Mulher, num quadro de uma deliberada cortina de silêncio à divulgação desta Manifestação Nacional de Mulheres por parte da comunicação social, é explicada pela justeza dos seus objectivos e reivindicações, mas também pelo importante património de prestígio, enraizamento e influência entre as mulheres que o projecto unitário deste movimento construiu ao longo de mais de 50 anos de acção e luta.
Silêncio tanto mais escandaloso quanto alguns órgãos de comunicação social usaram imagens da dimensão de massas desta Manifestação para ilustrar iniciativas de outros grupos, atribuindo-lhes uma dimensão que não tiveram. Acresce os dois pesos e duas medidas no modo de tratar a presença de dirigentes partidários na acção promovida pela Rede 8 de Março em torno da designada Greve Feminista, em que a presença de António Costa e de diversos dirigentes do PS, a par de Catarina Martins, entre outros dirigentes do BE, é referida de modo valorativo aos objectivos dos organizadores, sem beliscar a «natureza» supostamente independente dos seus promotores (quando alguns dos rostos da Rede 8 de Março são activistas partidárias).
Mas no caso da Manifestação promovida pelo MDM procurou-se usar a presença de Jerónimo de Sousa para insinuar a ideia da proximidade deste movimento com o PCP, para, deste modo, desvalorizar a alargada presença de milhares de mulheres nesta acção e o carácter unitário desta organização.
Desviar o foco
São posturas que não são neutras, nem tão pouco isentas, e não são dissociáveis do espaço mediático que é dado às teses dos que pretendem reescrever a história da luta das mulheres em Portugal e no mundo, erigindo o feminismo como a corrente determinante para os êxitos alcançados, um registo que não corresponde à verdade histórica. Ao mesmo tempo que, na actualidade, atribuem à acção do feminismo um papel que este não está em condições de desempenhar na luta das mulheres, uma vez que a sua acção se centra no fomento de uma «guerra entre sexos», na responsabilização do poder masculino pela violência doméstica e pelas desigualdades, para deste modo branquear a responsabilidade do sistema capitalista na permanente reprodução dos mecanismos de opressão, desigualdade e violência sobre as mulheres que este explora e pretende alienar.
A cobertura dada à intervenção da Rede 8 de Março na designada Greve Feminista pela generalidade da comunicação social só foi generosa porque ela não afronta as falsas políticas de igualdade realizadas pelos sucessivos governos da política de direita, nem tão pouco as realizadas pelo actual Governo minoritário do PS, que continuam subordinadas à agenda de temas e objectivos da União Europeia em matéria de igualdade de género. E, pelas mesmas razões, obteve os aplausos e apoio do PS (e o silêncio do PSD e CDS). De facto, o que se procurou foi esvaziar o conteúdo do direito à greve, deslocando-o do terreno das relações laborais e das suas implicações políticas para outros planos, esvaziando-o do seu conteúdo de classe.
Trata-se de pretender dispensar a unidade e a luta organizada das mulheres exploradas, oprimidas e violentadas pelo sistema capitalista enquanto protagonistas da sua própria libertação. Enganosamente, afirmam que só quem é feminista é que defende os direitos das mulheres, disfarçam os adversários de sempre como se fossem aliados e apresentam os apoiantes de sempre da luta das mulheres como inimigos. São estratagemas para criar a ilusão de que tudo pode mudar, para ficar tudo na mesma.
A luta das mulheres em Portugal, que tem lugar todos os dias, vai continuar a dar a resposta necessária a tais teses e objectivos.
Sem comentários:
Enviar um comentário
O seu comentário ficará disponível após verificação. Tentaremos ser breves.