2018/09/16

Uma Conversa Com Uma Margarida

Tudo isto porque alguém que permanecerá anónima postou o seguinte comentário sobre as vigarices constantes do relatório da ocde.

«Acho incrível que com o estado da saúde em Portugal e a falta de dinheiro, os senhores professores se ponham a pedir aumentos de ordenados. O hospital de Portalegre está uma desgraça em todos os níveis só para dar um pequeno exemplo. Gastar o pouco que há em algo que beneficia poucos parece correcto?
E mais, o pessoal que trabalha no privado também sofreu com a crise e continua a sustentar os funcionários públicos (MUITOS professores) sem pedir muito e sem aumentos de ordenados.»

Cara Margarida permita-me contra argumentar alguns dos seus pressupostos:

1. A falta de dinheiro para o sns é provocada antes de mais:
A. Pelos exorbitantes juros da divida contraida para salvar bancos e que ronda em média 7 000 000 000 (sete mil milhões de euros) anuais, quase tanto quanto se gasta com o sns.
B. Com as parcerias público privadas que transferem anualmente 1 700 000 000 (mil e setecentos milhões) dos nossos impostos para bolsos privados.

2. Atualmente os professores não estão a lutar por aumentos de ordenados. Atualmente os professores estão a lutar para verem contabilizado o tempo de serviço que, tendo sido congelado em 2008, lhes permite progredir na carreira tal como está escrito na lei que define a carreira docente, acordada há mais de dez anos após intensa luta dos professores. Os custos totais dessa implementação são inferiores a 500 000 euros por ano. Feitas as contas, um ano de juros da divida pagaria a legal progressão de 150 000 professores durante mais de 14 anos, mas como uma grande percentagem está já a atingir a idade da reforma, podemos falar em um quarto de século ou mais.

3. Os trabalhadores do setor privado não sustentam os funcionários públicos. Os funcionários públicos, e todo o restante funcionamento do estado (sns, escolas, tribunais, exército,  etc) são sustentados com verbas do orçamento de estado provenientes dos impostos cobrados a todos nós irs, iva, ispp, ist etc etc (incluindo os funcionários públicos), cobrados ao capital (irc), juros de empréstimos, lucros de empresas públicas etc, etc, etc. Já as reformas são pagas com verbas dos descontos que os trabalhadores dos setores público, privado e cooperativo fazem ao longo da sua vida de trabalho para os seus subsistemas de pensões e reformas.

4. Se os trabalhadores que podem, hoje, lutar por melhores condições (mais salário, menos horas de trabalho, mais saúde pública, melhor educação) não o fizessem, porque havia outros mais necessitados e que não podem lutar, ainda hoje éramos todos escravos. Quem pode lutar, hoje, por melhores condições de vida, tem a obrigação de o fazer, por sí e pelos que não podem fazê-lo. Dessa forma estão a criar condições para que outros possam usar o exemplo e lutar pelos mesmos ou melhores direitos. É por isso que eu sou solidário, sempre, com todas as lutas e greves de todos os trabalhadores, porque o facto de eles, hoje, abdicarem do salário que lhes faz falta ao fazerem greve pelos direitos deles, estão ao mesmo tempo a lutar pelos meus direitos e a facilitar a minha luta, hoje ou amanhã  ;-)

Cara Margarida, ao contrário do que os media corporativos a levam a acreditar, são centenas de milhar os trabalhadores de empresas privadas que por esse país fora lutam por melhores condições de vida: contratos coletivos, maiores ordenados, menos horas de trabalho.

Deixo-lhe aqui meia dúzia de exemplos de lutas que as têvês e os jornaleiros silenciam:

Nos super e hipermercados exigem aumentos salariais

No grupo Barraqueiro conseguiram manter um bom acordo de empresa

A CGTP exige um aumento de 4% para   t o d o s   os trabalhadores
 
Na misericórdia de Murça lutam pelo pagamento de salários em atraso

Como vê Margarida, por esse país fora são muitos a lutar por melhores condições de trabalho ;-)

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