2019/02/25

Venezuela: Sábado 23 Narrado Passo a Passo

O Brasil de Fato publicou duas reportagens presenciais, nas quais, de forma muito sucinta e objetiva, se apresentam os factos ocorridos nas fronteiras da Venezuela com a Colômbia e com o Brasil durante o passado sábado dia 23 de Fevereiro.

Pela clareza e objetividade são dois exemplos de jornalismo com os quais os escribas nacionais poderiam aprender, se soubessem ler. @Refer&ncia

Um dia de tentativa de golpe na fronteira Brasil-Venezuela
(André Vieira, Brasil de Fato, Pacaraima (RR), 2019/02/24 às 12:43)

Da fronteira com a Venezuela, em Roraima, o repórter André Vieira relata os conflitos e não vê nada de "humanitário"

As caminhonetes do governo brasileiro
que chegaram até a fronteira mas voltaram ao quartel.
(Créditos: Sebastián Soto)
Este sábado (23), na fronteira entre Brasil e Venezuela, foi um dia de expectativa. Desde quinta-feira (21), a passagem entre os dois países está fechada por decisão do presidente Nicolás Maduro por conta das ameaças de ataques contra a soberania de seu país.

Pela manhã, a cidade brasileira de Pacaraima, recebeu a chegada da comitiva do chanceler brasileiro acompanhada do representante diplomáticos dos Estados Unidos e da enviada por Juan Guaidó. Eles deram declarações sobre a operação de entrega da suposta ajuda humanitária, denunciado pelo governo venezuelano e por parte da comunidade internacional como mais uma etapa do golpe de estado contra Maduro.



Ainda pela manhã, apesar de haver sido prometido um carregamento de 200 toneladas, chegou em Pacaraima, do lado brasileiro da fronteira, a primeira caminhonete venezuelana. Veio da capital do estado de Roraima, Boa Vista, escoltada pela polícia brasileira e trazia uma parte dos produtos anunciados. Mais cedo, o chanceler Ernesto Araújo disse que a chegada dos produtos marcava o início de um processo.

Após o meio dia, chegou a segunda caminhonete. Ao longo de toda tarde, os dois veículos estiveram na fronteira. Também chegaram em Pacaraima duas ambulâncias que traziam feridos do lado venezuelano. Assim como na sexta-feira, foram os únicos veículos autorizados a cruzar a fronteira desde o seu fechamento.

Ao fim da tarde, houve um primeiro conflito entre os participantes do operativo da chama ajuda humanitária e as duas caminhonetes se encaminharam para o pelotão do exército brasileiro e não voltaram mais.

Pouco depois, um grupo começou uma provocação mais forte contra os militares venezuelanos. Atiraram pedras e coquetéis molotov. Carros e uma casa militar venezuelana foram incendiados próxima a um posto da PDVSA, o que foi respondido pelos militares venezuelanos com bombas de gás lacrimogéneo para dispersar o ataque.

Do lado brasileiro, a polícia ordenou que os manifestantes se afastassem da fronteira, ocupada por eles durante todo o dia. Eles retornaram ao centro da cidade da brasileira.

O dia, prometido pelos opositores de Nicolás Maduro como um dia chave, terminou nesta fronteira sem o cruzamento de nenhuma suposta ajuda humanitária.

Edição: Pedro Ribeiro Nogueira
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Plano de Guaidó fracassou; saiba como foi o sábado (23) de conflitos na fronteira
(Fania Rodrigues, Brasil de Fato, San Antonio del Táchira (Venezuela), 2019/02/24 às 11:35)

Sem conseguir ingressar "ajuda humanitária" na Venezuela, opositor anunciou que vai a Bogotá na segunda (25).

A promessa de fazer entrar a "ajuda humanitária" do líder opositor Juan Guaidó, autoproclamado "presidente interino da Venezuela, não foi cumprida, apesar das diferentes tentativas em vários pontos das fronteiras venezuelanas. Os atos opositores na fronteira com a Colômbia provocaram ações violentas e deixaram 49 pessoas feridas, entre elas sete militares. Três pessoas apresentaram ferimentos com queimadura. Não houve registro de mortes nessa região de fronteira com a Colômbia, até o momento. O balanço de feridos foi feito pelo representante do governo nacional no estado fronteiriço de Táchira, Freddy Bernal.

As pontes internacionais Simón Bolívar, Francisco de Paula Santander, em Ureña, e Las Tienditas foram os centros dos protestos opositores, mas também ocorreram distúrbios no centro das cidades fronteiriças de Ureña e San António de Táchira, onde um guarda nacional teve o rosto queimado por um coquetel molotov lançado por simpatizantes de Guaidó.

As rodovias foram cortadas por opositores em vários pontos do estado de Táchira. A Guarda Nacional Bolivariana também fechou algumas estradas e rodovias. O aeroporto de Ureña foi tomado por um grupo opositor, mas depois recuperado pelos militares venezuelanos. No final do dia, o número de militares desertores eram nove, entre eles o major-general Hugo Parra Martínez. No entanto, o governo afirma que essa quantidade de deserção é insignificante.

Do lado colombiano, o número de manifestante opositores em todos os pontos de enfrentamento eram em média entre 300 e mil pessoas. Do lado, venezuelano quem liderou a resistência para impedir a entrada de opositores e militares colombiano foram os civis, das brigadas bolivarianas, uma organização cívico-miltar com treinamento, mas composta por trabalhadores comuns, operários, professores, camponeses. A professora Rubio Godoy, era uma das que estava na frente da defesa da ponte internacional Simón Bolívar. "Nós estamos aqui dispostas a defender nossa pátria com nossa vida se for preciso", afirma a brigadista. Como ela, cerca de 1.500 cidadãos ocuparam a ponte. Um carro foi queimado por opositores do lado colombiano. Opositores e defensores do governo Maduro enfrentaram-se por várias horas, com pedras e uso da força física, mas sem uso de armas de fogo.

Já em Las Tienditas, palco da disputa política internacional, se encontrava Juan Guaidó, junto com o presidente colombiano, Ivan Duque e o secretário da Organização de Estados Americanos (OEA), Luis Almagro. As equipes de transmissões dos grandes canais de televisão internacionais também se concentravam nesse ponto. Do lado, venezuelano, na linha fronteiriça da ponte, era possível ouvir a voz do líder opositor Juan Guaidó, que em dois momentos fez discursos inflamados convocando as pessoas a adentrarem à força o território venezuelano. Cerca de 300 pessoas, entre jornalistas e opositores estavam no local. Do lado, venezuelano um acampamento permanente cerca 800 brigadista populares.

Por volta das 16h, Guaidó anunciou que já não tentariam entrar na Venezuela nesse dia. E, pela noite, afirmou que irá a Bogotá, na segunda-feira (26), para participar da reunião de ministros do grupo de Lima, que reúne 13 países.

Viralizou nas redes sociais a foto de Guaidó,
Duque (Colômbia), Piñera (Chile) e Almagro (OEA)
com expressões decepcionadas.

Em outro ponto do município de Ureña, poucos quilômetros distante da ponte Las Tienditas, ocorreram protestos na ponte Santander. Três caminhões carretas com ajuda humanitária foram queimados por opositores, segundo apurou a reportagem do Brasil de Fato. Alguns meios de comunicação publicaram a informação dizendo que foram incendiados por militares da Guarda Nacional Bolivariana. No entanto, fotos e relatos de testemunhas mostraram depois que foram os opositores simpatizantes de Guaidó quem realizaram a queima dos caminhões, que não puderam cruzar a fronteira.

Simpatizantes de Guaidó são flagrados
queimando caminhão de "ajuda humanitária"
Foto: Brigadas Bolivarianas
Governo venezuelano rompe relações com a Colômbia

O governo colombiano deu apoio político e militar para o opositor Juan Guaidó, nesse sábado (23), dia que marcou o aniversário de um mês de sua autoproclamação como presidente interino. Depois da série de eventos violentos, o governo da Venezuela informou que rompeu relações diplomáticas com a vizinha Colômbia.

"Governo da República Bolivariana da Venezuela decidiu pela ruptura integral das relações diplomáticas e consulares com o governo da República da Colômbia. Consequentemente, é concedido um período de 24 horas, a partir da publicação deste comunicado à imprensa, para que diplomatas e funcionários consulares colombianos deixem a Venezuela. Durante este período, o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela oferecerá todas as facilidades para o cumprimento desta disposição pelos funcionários diplomáticos e consulares colombianos", afirmou o governo de Nicolás Maduro, através de um comunicado.

"Os governos dos EUA e da Colômbia violaram praticamente todos os princípios e propósitos da Carta da ONU, fato que constitui uma provocação inaceitável contra a República Bolivariana da Venezuela, e que coloca a paz nacional e regional em risco", destacou.

Este domingo (24), está programado um discurso do presidente da Colômbia, Iván Duque, na cidade de Cúcuta, próximo da ponte Simón Bolívar.

Edição: Pedro Ribeiro Nogueira
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Além dos dois artigos acima publicados o mesmo Brasil de Fato produziu uma linha do tempo sobre a ingerência dos EUA na soberania do país caribenho nestes primeiros dois meses de 2019.

Contexto
O autoproclamado “presidente interino” da Venezuela, Juan Guaidó anunciou que o país será invadido à força neste sábado (23) para viabilizar a entrega de “ajuda humanitária” à população.

Herdeiro político do ex-presidente Hugo Chávez, Maduro chegou ao poder em meio à comoção pela morte do líder que, além de impulsionar a chamada Revolução Bolivariana, colocou o país petroleiro no mapa geopolítico mundial. A ausência de Chávez, no entanto, fortaleceu a oposição, que não deu trégua ao governo Maduro, primeiro não reconhecendo sua vitória, passando por tentativas de tirá-lo do poder por meio de referendo ou promovendo boicotes e protestos.

Petróleo
Com mais de 2,9 bilhões de barris por ano, os EUA são os maiores importadores de petróleo do mundo. Cerca de 500 milhões de barris vêm da Venezuela, cujas reservas são dez vezes maiores que as estadunidenses.

O país latino-americano é considerado estratégico, do ponto de vista logístico, porque o custo de importação é inferior àquele importado do Golfo Pérsico, por exemplo, com tempo reduzido entre a produção e a entrega.

Na Venezuela, o Estado controla a produção, a distribuição e o destino da renda do petróleo, e é visto como um impedimento à dominação econômica e política dos EUA no continente.

Confira a linha do tempo das tensões que se acirraram em 2019

4 de Janeiro
Grupo de Lima, que reúne 14 países, emite comunicado afirmando que não iria reconheceria novo mandato do presidente chavista Nicolás Maduro, eleito no dia 20 de maio para o período 2019-2025.

5 de Janeiro
A Assembleia Nacional, com seus poderes suspensos pela Justiça, por desacato a uma decisão judicial, após dar posse a três deputados de oposição acusados de crimes eleitorais, escolhe nova mesa diretiva e indica o deputado Juan Guaidó para a presidência. Em consonância com o Grupo de Lima, diz que há “uma ditadura” e não reconhecem a eleição de Maduro.

10 de Janeiro
Presidente Nicolás Maduro toma posse e faz juramento diante do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ). Constituição venezuelana estabelece que na ausência do Poder Legislativo o presidente eleito deve juramentar diante do TSJ. No dia da posse, uma multidão ocupa as ruas do centro de Caracas em apoio ao presidente Nicolás Maduro. Representantes da ONU e mais de 90 países participam da posse e reconhecem legitimidade de Nicolás Maduro.

11 de Janeiro
Oposição realiza ato político, com pouca adesão da população — cerca de 300 pessoas, no município de Chacao, na grande Caracas. Neste dia o deputado Juan Guaidó disse pela primeira vez que tinha “legitimidade para assumir a presidência interina do país”. Nesse mesmo dia o secretário da Organização de Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, publica no Twitter uma saudação à Guaidó, como se já fosse presidente: “Saudamos a assunção de Guaidó, como presidente interino da Venezuela, conforme o artigo 233 da Constituição Política”, escreveu Almagro.

23 de Janeiro, em três atos
São realizadas duas grandes marchas em Caracas, da oposição e da situação, de magnitudes semelhantes. No centro da cidade, apoiadores de Maduro lotam as ruas. No município de Chacao opositores marcham contra o governo.

Durante o ato dos partidos de oposição, Guaidó, se autoproclama presidente interino da Venezuela. O governo dos Estados Unidos reconhece imediatamente a autoridade de Guaidó. Em seguida, os países do grupo de Lima, com exceção do México, acompanham os EUA. O México reconhece a legitimidade do governo Maduro e advoga pela autodeterminação dos povos.

Presidente Nicolás Maduro anuncia que Venezuela rompeu relações diplomáticas com os EUA estabelece prazo de 48 horas para o corpo diplomático deixar o país e chama de volta seus embaixadores. Primeiro o governo dos norte-americano afirma que não vai retirar os diplomatas porque já não reconhecem o governo Maduro, mas antes de encerrar o prazo a embaixada retira o corpo diplomático.

24 de Janeiro
– Estados Unidos convoca reunião da Organização de Estados Americanos para discutir o tema Venezuela. Durante sessão da OEA, o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, anuncia ajuda humanitária de US$ 20 milhões de dólares. Nesse momento já haviam sido bloqueados US$ 23 bilhões de dólares do governo venezuelano no exterior, a pedido do governo dos Estados Unidos. 17 países apoiam pedido de diálogo defendido pelo governo de Nicolás Maduro. Outros 16 se mostram contrários ao governo Maduro e reconhecem Juan Guaidó como presidente interino da Venezuela, entre eles, 13 países do grupo de Lima.

26 de Janeiro
A pedido dos EUA, Conselho de Segurança da ONU debate a situação na Venezuela. Como já havia ocorrido na OEA, também no Conselho de Segurança, a maioria dos países se mostram contrários a deposição do presidente Maduro e pedem diálogo. Não houve votação, mas de acordo como o pronunciamento, 20 países se mostraram favoráveis ao diálogo e a uma saída negociada e 17 países foram favoráveis à interferência estrangeira.

4 de Fevereiro
A Venezuela começa um dos maiores treinamentos militares da história do país, com a participação de cerca de 2 milhões de militares e integrantes das brigadas bolivarianas, que são compostas por civis com treinamento militar, preparados para agir em situação de crise.

Países europeus reconhecem Juan Guaidó como presidente interino, entre eles França, Reino Unido, Espanha, Portugal, Alemanha, Áustria, Holanda, Suécia, Polônia, Dinamarca, Bélgica e República Tcheca. No entanto, Itália e Grécia não reconhecem Guaidó.

6 de Fevereiro
EUA acusa a Venezuela de bloquear a ponte internacional Las Tienditas, na fronteira com a Colômbia, para impedir entrada de “ajuda humanitária”. Entretanto, a ponte não foi inaugurada e nunca foi usada.

7 de Fevereiro
Países latino-americanos, caribenhos e europeus realizam reunião em Montevidéu, no Uruguai, para discutir uma saída pacífica para crise na Venezuela. Dessa reunião saem duas propostas. México, Uruguai, Bolívia e 14 países da Comunidade de Estados do Caribe (Caricom) criam o “Mecanismo de Montevidéu”, um grupo que tem objetivo de proporcionar um diálogo entre oposição e governo venezuelano. Já os países da União Europeia criaram um “Grupo de Contato”, que seria enviado a Caracas para negociar um possível adiantamento das eleições presidenciais.

12 de Fevereiro
Juan Guaidó anuncia que partidos opositores ao governo de Maduro farão caravana de Caracas até a fronteira para fazer entrar a “ajuda humanitária” em território venezuelano.

14 de Fevereiro
O empresário bilionário britânico, Richard Branson anuncia que fará um mega show no dia 22 de fevereiro, em Cúcuta, cidade colombiana, na fronteira com a Venezuela. Entre os artistas anunciados estão Miguel Bosé, Luis Fonsi, Maluma, Carlos Vives, Maná, Diego Torres, Peter Gabriel, Ricardo Montaner e Alejandro Sanz.

18 de Fevereiro
Governo venezuelano informa que também serão realizados shows e eventos culturais do lado venezuelano da fronteira também no dia 22.

23 de Fevereiro
Data em que o autoproclamado “presidente interino” da Venezuela, Juan Guaidó, anuncia que o país será invadido à força para viabilizar a entrega de “ajuda humanitária” à população.

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